Antes de qualquer
coisa, gostaria de pedir sinceras desculpas aos leitores deste blog pelo tempo
exageradamente longo que passei sem publicar uma única resenha. O aconteceu é
que FELIZMENTE tive que ocupar todo o meu tempo com importantes tarefas
paternais, já que Elisângela retornou da licença maternidade e as tarefas aqui
em casa, principalmente no que concerne a Duda, precisam ser executadas pelos
dois. É claro que isso não me deixou sem tempo por completo, principalmente
durante a noite. Li alguma coisa, assisti a bons filmes e isso é o que importa. Hoje, por
exemplo, estou aqui para comentar sobre um belo livro que li recentemente e do
qual guardo saborosas impressões. Trata-se de “O Retrato da Mãe de Hitler”, do escritor português Domingos
Amaral. Esta obra é a continuação do magnífico "Enquanto o Ditador Dormia", já comentado aqui no blog (clique no link) http://www.expressocultural-jeferson.blogspot.com.br/2010/09/mais-um-grande-trabalho-historico.html. Foi um prazer regressar, com O Retrato da Mãe de Hitler (uma edição
Casa das Letras), a este mundo da espionagem, ainda para mais centrado em
Lisboa, que geralmente fica fora do roteiro da literatura relativa a este
período tão importante e cativante da história. É que se em termos bélicos a
guerra não passou por Portugal, já em termos de informação, segredos e
espionagem, Portugal, e principalmente Lisboa, foi palco de importantes
movimentações.
Mas se em Enquanto
o Ditador Dormia a ação decorria em plena guerra, este O Retrato da Mãe de Hitler passa-se no pós-guerra e baseia-se na
questão dos tesouros nazistas que estes, os nazistas que escaparam, tentavam vender
pelo caminho para financiar uma nova vida longe dos seus perseguidores,
principalmente na América do Sul.
Em O Retrato da Mãe de Hitler, Domingos
Amaral recorreu, basicamente, aos mesmos personagens de Enquanto o Ditador Dormia, aproveitando até para atar algumas
pontas que tinham ficado “soltas”. Terá desta vez mais romance e menos
espionagem, mas mantém as características de um genuíno page-turner, sem
momentos mortos e com uma escrita clara cinematográfica, capaz de prender o
leitor. (A cena final, num hidroavião clipper decolando do Tejo, em Lisboa, é o
melhor exemplo da cinematografia deste livro).
O protagonismo é de novo entregue a Jack Gil
que tem de lidar, desta vez, com mais um oponente terrível, o seu pai. Ao mesmo
tempo tem de lidar com a sua antiga paixão, a arrebatadora, surpreendente e reaparecida
Alice, sempre dúbia nos seus comportamentos e nas suas alianças e motivações.
Enquanto se “entretém” com ela, com o pai e com as pretensões deste em
apoderar-se de tesouros nazistas em trânsito por Portugal, Jack Gil tenta
organizar a sua vida, unindo-se a Luisinha, irmã da sua falecida noiva e a quem
aprende a amar, depois de uma vida de orgia que por vezes tem dificuldade em
deixar para trás.
Este romance apresenta uma série de pormenores
curiosos sobre a sociedade portuguesa da época, retratando o modo de vida daquele
país nos tempos de Salazar, onde as liberdades eram muito limitadas. Basta ver,
por exemplo, como era a difícil relação com o cinema de Hollywood, aqui bem
retratada por via da paixão da personagem Luisinha pela sétima arte. É,
portanto, um bom retrato de uma época, numa profunda investigação por parte de
Domingos Amaral, que soube passar para o papel, bem misturado com a animada
ficção que criou, as informações recolhidas em arquivos e documentos.