quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A Sombra do Vento. A força da Escrita



Carlos Ruiz Zafón é uma revelação na literatura espanhola contemporânea. Seu primeiro livro, A Sombra do Vento, tornou-se logo um sucesso de crítica e de público. Nesta obra situada no período pós-Guerra Civil Espanhola, em 1945, que coincide também com o fim da sangrenta Segunda Guerra Mundial, o autor apresenta uma Barcelona ainda devastada pelas feridas que se recusam a cicatrizar.
Na cidade marcada por um confronto e um governo totalitário sobre o qual todos se recusam a falar, e sequer a refletir, como se fosse possível ocultar uma vergonha que dilacera a alma de cada habitante da Espanha de Franco, um garoto de 10 anos, chamado Daniel Sempere, inicia sua precoce transição para a maturidade ao ser conduzido por seu pai ao Cemitério dos Livros Esquecidos.
Órfão de mãe, inconformado com sua partida e incapaz de recordar seu semblante, o menino é presenteado pelo pai com a iniciação em um universo desconhecido, uma biblioteca secreta na qual repousam obras esquecidas pelos leitores, à espreita do momento oportuno para despertarem novamente. Seguindo um ritual antigo, o pai o incentiva a escolher em meio ao labirinto infinito de livros, um que ele deseje adotar e cuidar para o resto da vida.
Daniel opta então por uma obra que transformará sua vida e a dos personagens que o cercam, o romance A Sombra do Vento, do desconhecido autor espanhol de origem francesa, Julián Carax. O garoto devora o livro e fica obcecado por seu misterioso criador e pela origem desta publicação fascinante, passando assim a percorrer uma jornada arriscada que pode custar sua própria vida, ou a de seus companheiros.
As descobertas de Daniel remetem o leitor a outra história, ou seja, a um enredo dentro de outro, mas não demora para que ambos se entrelacem e componham uma única trama, surpreendendo a cada momento os que se aventuram pelas páginas desta obra incomum, repleta de misticismo, mortes, amores intensos e desesperados.
Nesta busca incessante, que o persegue ao longo de anos, Daniel revisita a trajetória de Barcelona, desenterra personagens e dramas aparentemente sepultados pelo tempo, e é através dele que Zafón toca nas feridas mais profundas desta cidade, não permitindo que a memória de eventos obscuros e dolorosos, porém concretos e reais, embora perturbadores, seja apagada pela historiografia oficial.
De forma crua e às vezes até sombria e pessimista, o autor devassa os bastidores da Guerra Civil, não poupando anarquistas, comunistas nem fascistas, transformando em um eterno ponto de interrogação, em um profundo questionamento, os fatos que se desenrolaram nos dias que antecederam este confronto, durante as lutas sangrentas, e no contexto que se seguiu a este embate.
Ao percorrer as páginas deste livro, o leitor dificilmente consegue parar até mesmo para respirar, pois se depara com uma trama eletrizante, que lembra clássicos como os livros sombrios de Edgar Allan Poe, os romances de amor do francês Victor Hugo, e os espadachins de Alexandre Dumas. É fácil perceber, em sua leitura, o culto à natureza misteriosa dos livros.

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