sábado, 31 de dezembro de 2011

Minhas Tardes com Margueritte









Duas situações um pouco desconcertantes me acertaram em cheio quando na quinta-feira, fui assistir esta bela película na sala de Cinema do Museu, aqui em Salvador. A primeira se trata do fato de as empresas responsáveis por editar e traduzir os filmes insistirem em dar cor branca e extrema luminosidade às legendas. Fica complicado ler em alguns momentos, comprometendo a compreensão do filme. A segunda situação é mais de âmbito pessoal. Ao ver Gérard Depardieu em cena me assustei profundamente. Nossa senhora, como este homem está gordo! Nem parece aquele galã do filme "1900" de Bertolucci, ou o esbelto administrador da trama "A Mulher do Lado", de Truffaut. Na verdade o que me deixa incomodado é o fato de que com mais alguns quilinhos estarei muito parecido com ele. Mas vamos deixar de conversa fiada e passar para a análise deste belo e tocante filme. Sabe aquele tipo de história que vai envolvendo o espectador aos poucos e quando a gente se dá conta, está totalmente entrelaçado, chegando às lágrimas de tanta emoção? É o que aconteceu comigo ao assistir esse filme francês “Minhas Tardes com Margueritte”, dirigido por Jean Becker e estrelado por Gérard Depardieu, que vive o cinquentão Germain, um homem aparentemente grosseiro e abrutalhado.
No entanto, a vida de Germain sempre foi recheada de intolerância e o que hoje conhecemos como bulling desde pequeno: como era gordinho e alto, ele era achincalhado constantemente no colégio, tanto pelos companheiros como pelo educador. E em casa era a mesma cena, pois a mãe (interpretada por Claire Maurier) nunca o aceitou por ter sido fruto de um relacionamento passageiro (o nosso bom grandão nunca conheceu o seu pai), e as brigas eram constantes. Por não reagir, ele se fechava e até à vida adulta sofre gozação dos amigos e é agredido pela mãe. Porém, a vida do vendedor Germain se transforma quando num belo dia ele decide comer seu lanche na praça e conhece Margueritte (Gisèle Casadesus), uma anciã de 95 anos que, para distrair-se do lar de idosos, onde mora lê seus livros no banco dessa pracinha. De forma polida, Margueritte pergunta se ele não quer ouvir a história que ela está lendo; ele aceita e surpreende a velhinha, com sua memória auditiva. A partir desse dia, pontualmente eles se encontram para a leitura e aos poucos ela o traz para o mundo das palavras (mais uma vez a literatura mudando vidas). É sua redenção! Germain reluta, mas seu interesse pelos livros é tanto que, ao saber que Margueritte sofre de problemas de visão e pode ficar cega, ele passa a ler as histórias para ela!
A modo como o diretor conta a história do rude Germain é que provoca o envolvimento do espectador. O vendedor de legumes não só vende as verduras como cultiva tudo em sua pequena propriedade. Sua relação com a namorada é de extraordinária amabilidade e, a partir de sua relação com Margueritte, entendemos como Germain é sensível, amoroso e fraterno. Ele que cuida da mãe, que continua mal-humorada até a morte. É ele que, nos momentos de dificuldade, conforta e dá amparo aos amigos.
O grandão na verdade é um homem gentil e solidário. Esse diamante quem lapidou foi Margueritte, com a palavra, com a literatura. A palavra trouxe aquele garoto acuado para a realidade, de um mundo obscuro e introspectivo para a luz e o amor. Como no final o diretor optou por colocar apenas a voz de Germain contando a história, fiquei com a impressão de que Germain é o autor do livro que lê para aquela, que passou a ser sua verdadeira mãe, Margueritte. Confesso a minha emoção. Emoção pelo simples, que faz o diferencial em nossa vida. Emoção pelas palavras e ensinamentos que surgem desta arte chamada cinema, e que fazem a vida mais colorida e com mais sentido. O sentido do deslumbramento. Quero continuar a me emocionar, ler grandes livros e passar deliciosas tardes com Margueritte.

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