“Eu desejava acomodar-me dentro do bolso de alguém
e poder pular para dentro e para fora, quando me conviesse. Agora ando por aí
ouvindo as queixas de mulheres que, segundo imagino, estão presas nos bolsos de
outros”.
Liv Ullmann.
Esse é um dos vários trechos do sincero livro de
Liv Ullmann, Mutações. Em 218 páginas, Liv descreve com sensibilidade e
inspiração fatos importantes do seu cotidiano, conduzindo o leitor rumo aos
bastidores do mundo glamourizado do cinema do qual faz parte há muitos anos. Liv
é reconhecida por ter sido companheira e musa do renomado diretor Ingmar
Bergman. No entanto, cabe destacar que seu talento ultrapassa a mera alcunha de
"musa norueguesa". Também nada tem a ver com "diva",
"sex symbol".
Não; Liv nada tem de musa; não lembra o encanto natural e quase infantil de
Audrey Hepburn, tampouco possui o sex appeal de Greta Garbo. Liv é uma mulher a
qual podemos classificar como "normal": hesitante, solitária, afetuosa,
carente. Poderíamos aqui estar falando, de acordo com essa descrição, de
qualquer mulher contemporânea, poderia até estar falando de alguém que de
repente esteja lendo essas despretensiosas linhas. Ao contrário do que possa
parecer para muitos, não é intenção desta grande atriz fazer de Mutações
uma mera autobiografia, também não me parece que o livro penda para o que
poderíamos chamar de "expiação de culpa" ou mesmo que possa ser
classificado como um best-seller. Sem dúvidas haverá os interessados,
fãs do cinema sueco de Bergman (e eu sou um deles), admiradores da atriz e
diretora, mas , não creio que estes leitores sejam tantos a ponto de fazer o
livro tornar-se o que o Brasil convencionou chamar de best seller, nos moldes
de um Paulo Coelho.
O livro é simples e belo em sua singeleza. Não
existe nele nada do que não possamos saber com o passar dos anos dessa vida que
vamos vivendo, assim, um dia após o outro. Também não se fala de viagens
interplanetárias, nem lições de vida de pessoas bem sucedidas
profissionalmente. Não; o livro também não narra a história romanceada de
ninguém, conta apenas a história de vida de Liv, a mulher, por trás da máscara
da atriz, à qual a mesma tanto se refere. Por isso, o leitor é convidado a
invadir os bastidores de Hollywood e entender que o luxo e o glamour escondem
coisas das quais duvidam nossa vã filosofia, vai também conhecer o universo dos
romances de Liv, especialmente o romance com Bergman, do qual Linn é fruto,
compreender o jogo de egos e a relação conturbada que vivia ela, a atriz
submetida ao diretor, mas, primeiro de tudo, ela, mulher, ele, homem. E isso já
dá muito pano pra manga ou página de livro. Digo a vocês, nem precisava estar
aqui falando de Liv Ullmann e Ingmar Bergman.
Ao ler Mutações, deparei-me com o universo
da construção dos personagens, com o mundo que se apresenta a Liv e que se faz
presente no seu modo de interpretar, dizer verdades mentindo. Em Mutações
o leitor encontrará tudo isso, talvez possa se identificar em diversos
momentos, talvez venha até a enternecer-se e a sentir uma espécie de empatia
por Liv que conseguiu escrever um livro com a alma. Ah, e por acaso ela também
era atriz. E que atriz.
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